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Liminares autorizam a não transferência de créditos de ICMS nas operações interestaduais de transferência de mercadoria

Na transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo titular não ocorre o fato gerador do ICMS, visto que se trata de mero deslocamento, conforme decidido pelo STF na ADC nº 49, no ARE nº 1.255.885, com repercussão geral reconhecida (Tema 1099), bem como decidido pelo STJ no REsp nº 1.125.133/SP e Súmula 166.

Pois bem, após o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, pelo STF, que declarou a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996) que possibilitava a cobrança do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica com eficácia a partir do exercício financeiro de 2024, o CONFAZ celebrou o Convênio ICMS nº 178, de 1º de dezembro de 2023, implementado na legislação paulista pelo Decreto nº 68.243, de 22.12.2023 – publicado em 26.12.2023.

De acordo com as normas do Convênio CONFAZ acima citado, mesmo que na transferência de mercadoria não ocorra o fato gerador do ICMS, o contribuinte deve observar, no que se refere às operações interestaduais, que o crédito inicialmente apropriado, deve ser transferido para o estabelecimento que irá receber a mercadoria transferida, sendo essa transferência obrigatória.

Por outro lado, é obrigatória a apropriação de crédito do ICMS pelo estabelecimento destinatário na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade.

Para operacionalizar as operações interestaduais, na nota fiscal deve ser mantido o destaque do imposto para fins de transferência do crédito, sendo que o valor a ser transferido será obtido mediante a aplicação da alíquota interestadual, sobre o valor atribuído na transferência.

O ICMS a ser transferido deve ser lançado a débito na escrituração do estabelecimento remetente e a crédito no estabelecimento destinatário e se houver saldo credor remanescente de ICMS no estabelecimento remetente, este será apropriado pelo contribuinte junto à unidade federada de origem.

Como se vê, o Convênio n° 178/2023, internalizado pelo Estado de São Paulo, não deu a opção ao contribuinte de transferir ou não o crédito e tornou obrigatória a apropriação de crédito do ICMS no estabelecimento de destino.

Posteriormente sobreveio a Lei Complementar nº 204, de 28 de dezembro de 2023, que incluiu o §4º ao artigo 12 da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, com a seguinte redação:

“§ 4º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais em que os créditos serão assegurados:

I – pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitados aos percentuais estabelecidos nos termos do inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada;

II – pela unidade federada de origem, em caso de diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o transferido na forma do inciso I deste parágrafo.”

Inconformados, diversos contribuintes têm impetrado mandados de segurança para afastar a obrigatoriedade da transferência de crédito.

Os contribuintes alegam que, conforme decisão firmada pelo STF no julgamento da ADC 49, o creditamento do ICMS nessas operações seria uma faculdade do contribuinte e não uma obrigatoriedade.

Afirmam que, em sede de julgamento dos embargos de declaração para modular os efeitos do acórdão proferido no âmbito da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, o Ministro Edson Fachin esclarece que a transferência interestadual da mercadoria entre estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica corresponde a mera movimentação física. Vale dizer, a movimentação interestadual, por ser meramente física, seria equivalente a trocar a mercadoria de prateleira, o que configura hipótese estranha ao ICMS. Contudo, o Ministro destacou que a transferência de mercadorias não implica no afastamento do direito ao crédito da operação anterior em respeito ao princípio da não-cumulatividade, devem ser mantidos os créditos da operação anterior.

O Ministro Edson Fachin destacou no seu voto: “No cenário de busca de segurança jurídica na tributação e equilíbrio do federalismo fiscal, julgo procedentes os presentes embargos para modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos“.

Nesse mesmo julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso, decidiu da mesma forma que o Ministro Fachin, consignando que após o prazo concedido aos estados para disciplinarem a transferência de créditos de ICMS dessas operações, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos, sendo essa uma faculdade do contribuinte.

Por sua vez, o Ministro Dias Toffoli, afirmou que as transferências interestaduais de bens de titularidade do mesmo contribuinte não há obrigação de realizar o estorno dos créditos de ICMS em razão da saída de mercadoria de um estabelecimento para outro de mesma titularidade.

O Ministro Dias Toffoli ressaltou que, caberia ao CONFAZ tão somente uniformizar os procedimentos a serem observados pelos estados e pelo Distrito Federal quanto a manutenção do direito ao creditamento de ICMS nas hipóteses de transferência interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, não cabendo ao Convênio dispor contrariamente à faculdade assegurada ao sujeito passivo de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, em respeito não cumulatividade, assim como previsto pelo artigo 10 da Lei Complementar Federal nº 87/1996 e art. 155, §2º, inciso XII, alínea d, da CF/88.

O Ministro Toffoli conclui, que findo o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica expressamente por decisão do STF com repercussão geral reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos.

Ocorre que, o Convênio ICMS nº 178, de 1º de dezembro de 2023, implementado na legislação paulista pelo Decreto nº 68.243, publicado em 26.12.2023, tornou obrigatória a transferência de crédito de ICMS na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, do estabelecimento de origem para o estabelecimento de destino.

Eis a cláusula primeira do convênio:

O Convênio n° 178/2023, internalizado pelo Decreto 68.243 de 2023 em SP estabelece:

Cláusula primeira: Na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, é obrigatória a transferência de crédito do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS – do estabelecimento de origem para o estabelecimento de destino, hipótese em que devem ser observados os procedimentos de que trata esse convênio.

Contudo, segundo os contribuintes, não foi isso que decidiu o Supremo Tribunal Federal, que destacou que é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado a título de ICMS, sendo um direito, uma faculdade e não uma obrigatoriedade.

O conteúdo do acórdão proferido nos embargos declaratórios da ADC 49 garante o direito do contribuinte em manter integralmente os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores no estabelecimento de origem, se essa for a melhor opção encontrada para a sua operação.

Ou seja, o STF decidiu que a possibilidade de que a transferência dos créditos deve ser tratada como um direito, e não como um dever.

Além disso, a Lei Complementar 87 de 1996 estabelece:

“Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.”

Ou seja, o creditamento do ICMS é um direito e não uma obrigação, não havendo também como se limitar o uso e aproveitamento de crédito, quando há transferência de mercadorias entre estabelecimentos, visto que não há operação de saída, e tampouco etapa sucessiva que autorize a anulação do crédito.

Nesse sentido, obrigar o Contribuinte a efetuar a transferência de créditos de ICMS, significa uma cobrança indireta sobre as operações.

Assim são inconstitucionais todas as normas editadas como decorrência da modulação da ADC 49, quais sejam as LC 204/2023, do Convênio ICMS 178/2023 e do Decreto Estadual nº68.243/2023.

Já estão sendo concedidas liminares pelo TJSP para assegurar o direito dos contribuintes.

Em um processo recente, o contribuinte ajuizou ação para ter assegurado o direito líquido e certo de apropriar-se do crédito de ICMS de forma facultativa no caso de operações de mera transferência entre unidades de mesma titularidade, ante afronta ao princípio da não cumulatividade (art. 155, parágrafo 2º, I, da CF) – por violar o direito de crédito, da isonomia tributária (art. 150, II, da CF) – visto que está se tratando de forma diferente as empresas que realizam transferências, das que não realizam o que implica em violação à livre iniciativa/livre concorrência (art. 170, IV e parágrafo único da CF). Além disso, viola o princípio da segurança jurídica (art. 5, inciso XXXVI, da CF) pois o convênio trata da transferência de forma diferente ao entendimento do STF e da LC 87.96, e ainda, diante da inconstitucionalidade formal ante a incorreta internalização do Convênio ICMS nº 178/2023, quando na verdade é indispensável a edição de lei específica para sua convalidação, em respeito ao princípio da legalidade.

Ao apreciar o pedido, o TJSP, em sede de agravo, concedeu liminar para declarar o direito de o contribuinte “apropriar-se do crédito referente ao ICMS, de forma facultativa, nas operações de mera transferência entre unidades de sua titularidade” (Agravo de Instrumento nº 2038251-19.2024.8.26.0000).

Por outro lado, no processo 1059697-78.2023.8.26.0114 que tramita perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Campinas, o contribuinte requereu a concessão de liminar para permitir que não seja obrigado a debitar o ICMS e/ou transferir os créditos de ICMS das operações anteriores quando movimentar bens de um de seus estabelecimentos para outro, afastando a aplicação do Convênio nº 178/23 nas operações de transferência entre filiais que realiza. Neste processo, também foi concedida liminar.

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