Por maioria, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) entendeu que a Lei 14.395/22, que define que, para fins de cobrança de IPI, praça é o município onde está localizado o remetente da mercadoria, não retroage. Na prática, a turma manteve a cobrança de IPI sobre operações de venda de mercadorias destinadas a empresa interdependente.
Segundo a fiscalização, o contribuinte teria pago um valor menor de IPI do que o correto por não ter respeitado o Valor Tributável Mínimo (VTM) aplicável ao caso. O valor deve ser tomado como base para o cálculo do IPI em casos de produtos destinados a estabelecimentos do próprio remetente ou com os quais possua relação de interdependência.
A companhia teria agido de forma equivocada ao não observar o conceito de praça contido no artigo 195 do Regulamento do Imposto Sobre Produtos Industrializados (RIPI) para definir o preço praticado na saída dos produtos para o contribuinte, reduzindo assim o montante a pagar de IPI. O dispositivo define que o valor tributável, que na prática é a base de cálculo do imposto, não poderá ser inferior “ao preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente quando o produto for destinado a outro estabelecimento do próprio remetente ou a estabelecimento de firma com a qual mantenha relação de interdependência”.
A empresa, situada no Rio de Janeiro, vende produtos higiênicos e cosméticos para a Distribuidora São João de Meriti, localizada em outro município carioca. Essa companhia vende, então, 4% da mercadoria para clientes da cidade do Rio de Janeiro e 96% para clientes do resto do país. O contribuinte e a distribuidora mantêm relação de interdependência, segundo a fiscalização.
Segundo o contribuinte, a mudança de critério em 2022 deve ser aplicada ao caso. Naquele ano, ao derrubar um veto imposto pelo presidente Jair Bolsonaro, o Congresso definiu que, para a legislação do IPI, praça é o município onde está localizado o remetente da mercadoria. Já o fisco defende que praça não equivale a município, uma vez que o próprio Carf já julgou que o termo equivale ao âmbito de abrangência de vendas, independentemente da municipalidade.
O relator, Rosaldo Trevisan, defendeu que a lei não menciona retroatividade, mas apenas altera a legislação vigente. Assim, negou provimento ao recurso do contribuinte.
O conselheiro Oswaldo Gonçalves de Castro Neves divergiu, afirmando que a lei não precisa ser textualmente retroativa para que seja aplicada a processos anteriores à alteração no dispositivo. “Praça nunca coincidiu com município, nem historicamente, nem juridicamente. Isso foi uma construção e depois, pelo jogo político, foi incluído em uma norma que praça é município”, destacou. O conselheiro Alexandre Freitas Costa seguiu a divergência do conselheiro Neves, mas defendendo que o conceito de praça sempre foi o expresso na nova legislação.
O placar final ficou 5X3, e, assim, não foi dado provimento ao recurso do contribuinte. O processo tramita com o número 10872.720074/2015-45 e envolve a Delly Kosmetic Comercio E Industria Ltda.
Um caso sobre o mesmo tema foi julgado em março pela 3ª Turma da Câmara Superior. Na ocasião, o resultado foi o mesmo, contrário ao contribuinte.
Fonte: JOTA – JULIA PORTELA – Repórter na cobertura de Carf no JOTA em Brasília. É jornalista, formada pela Universidade de Brasília (UnB). Antes, passou pela redação do Metrópoles nas coberturas de Judiciário, Legislativo e Executivo. Email: julia.portela@jota.info