A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) entendeu que o contribuinte pode deduzir, do Imposto de Renda (IRPJ), perdas por inadimplência em período posterior ao do reconhecimento da redução do crédito. A decisão é da 1ª Turma e foi dada em recurso do Banco Bradesco.
A instituição financeira foi autuada por não seguir o entendimento da Receita Federal. Para o órgão, a dedução e consequente redução do IRPJ só pode ser feita no período (ano) em que os requisitos previstos em lei para o reconhecimento de perdas por inadimplência forem cumpridos.
O banco tentou, na Câmara Superior, emplacar uma tese geral sobre a possibilidade de dedução fiscal de perdas depois de cinco anos do vencimento, mas esse ponto não foi analisado por falta de paradigma – decisão em sentido contrário, necessária para haver julgamento pela última instância do Carf.
Mas os conselheiros defenderam que, se não forem cumpridas as exigências da Lei nº 9.430, de 1996, são indedutíveis, na apuração do lucro real, as perdas no recebimento de créditos lançadas como despesas, ainda que se tenham passados cinco anos do vencimento do crédito.
Foi julgada pelos conselheiros da 1ª Turma, e aceita, a possibilidade de postergação dessas deduções, sem delimitação de tempo. No caso do Bradesco, os abatimentos, feitos em 2012, eram referentes ao período de 2008 a 2010.
De acordo com a Receita Federal, essas deduções não deveriam ter sido feitas naquele ano. Já o Bradesco alegou que o abatimento é uma faculdade e poderia ser realizado depois de implementados os requisitos legais.
No voto vencedor, a conselheira Edeli Pereira Bessa, representante da Fazenda, aponta que, caso as deduções tivessem sido efetuadas no prazo estabelecido pela Receita, não teria havido nenhum efeito financeiro imediato na apuração de resultado dos anos-calendários 2008, 2009 e 2010 – ocorreria aumento do estoque de prejuízos fiscais acumulados, para compensação em períodos subsequentes. Por outro lado, acrescenta, no ano-calendário de 2012, período em que se apurou resultados positivos, a dedução das perdas em questão se daria na forma de compensação de prejuízos do período anterior.
A conselheira afirma, no voto, que a Lei nº 9.430, de 1996, permite o registro, como perda, dos créditos decorrentes das atividades da pessoa jurídica em momento posterior ao prazo pós-vencimento estipulado em lei, ou mesmo depois de iniciada a cobrança administrativa ou judicial. “A forma como permitido o registro das perdas impõe concluir que é facultado ao sujeito passivo provisionar esta perda posteriormente, desde que permaneça atendendo aos requisitos legais em razão do valor do crédito e da existência, ou não, de garantia”, diz.
Ainda segundo o voto, se não há determinação legal de registro dessa perda provisória em momento específico, não é possível afirmar a existência de redução indevida do lucro real por inexatidão quanto ao período-base de escrituração, no caso, da dedução correspondente a esta perda. Nesse ponto, a decisão foi unânime (processo nº 16327.720979/2017-40).
O tributarista Leandro Cabral, sócio do Velloza Advogados, destaca que a decisão é positiva por reconhecer a possibilidade de dedução em período posterior, inclusive por não haver vedação legal e por não prejudicar a arrecadação fiscal. Ainda segundo Cabral, essa é a primeira decisão da Câmara Superior que enfrenta o tema de forma completa e confere segurança ao tratamento de perdas.
O advogado lembra que a Lei nº 14.467, de 2022, que produzirá efeitos a partir de janeiro de 2025, vai alterar a forma da dedução de perdas no recebimento de créditos no que diz respeito às instituições financeiras. A norma passa a tratar as perdas no momento de sua ocorrência (90 dias após a inadimplência) e obrigando seu registro nesse exato momento.
“A lei não altera o passado”, afirma o tributarista. A norma traz uma novidade para as financeiras e um movimento no mercado de revisão de procedimentos para apuração a partir de janeiro de 2025, acrescenta Cabral.
No caso, das duas teses em questão, o Carf julgou apenas a segunda, sobre a possibilidade de deduzir a perda fora do período em que ocorreu. Mas o primeiro tema – a dedutibilidade da perda depois de cinco anos, independentemente do cumprimento dos requisitos previstos em lei -, que não foi julgado, também é relevante, de acordo com o advogado.
Procurado pelo Valor, o Banco Bradesco informou que não iria comentar a decisão. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional não deu retorno até o fechamento da edição.